sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Os filhos da internet

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Tião Martins
Os filhos da internet
 

Novas tecnologias sempre produzem alterações significativas de comportamento. Imagine, por exemplo, quantas mudanças o rádio, o telefone e a TV, essas coisinhas tão triviais, trouxeram para a vida de milhões de pessoas, quando o seu uso se disseminou no planeta. Nada mais previsível, portanto, que a internet - a mais radical de todas as revoluções no campo da comunicação - esteja produzindo novos modelos de relacionamento e de socialização do saber e do conhecimento.
Também era previsível a reação negativa dos mais conservadores, que enxergam perigos mortais em qualquer inovação. Alguns chegaram a prever que a internet significaria o fim da cultura, na forma como a conhecemos há séculos. Ou o fim do humanismo, por isolar a pessoa de todas as outras e criar relações imaginárias entre seres apenas imaginados.
Como esse terrorismo intelectual, disfarçado de defesa da tradição humanista ocidental, tem acompanhado, ao longo dos séculos, quase todas as inovações tecnológicas, somos levados naturalmente a desprezar os fabricantes de pesadelos.
Entretanto, a cegueira dos otimistas também não é boa conselheira, quando analisamos as consequências sociais dessa presença dominante da internet no cotidiano de bilhões de pessoas e, principalmente, na rotina diária de crianças e jovens.
Uma revista científica britânica - a European Journal of Operational Research - publicou recentemente uma pesquisa reveladora: 75% dos mil jovens entrevistados admitiram que não conseguem viver sem a internet.
Até aí, nada demais, pois muita gente não consegue viver sem três horas diárias de televisão e nem por isso o mundo acabou. A preocupação ganha sentido, entretanto, quando se sabe que a ala jovem - entre 16 e 24 anos - apresenta a tendência de confiar mais na internet que em livros, professores, amigos e pais.
Preste atenção nos números: 45% dos entrevistados se sentem mais felizes quando estão online e 82% admitem que já usaram a internet para receber conselhos. E 32% disseram que não precisam conversar com pessoas reais sobre os seus problemas pessoais, pois encontram tudo que precisam na internet.
À primeira vista, a impressão que se tem é de que esses jovens nem querem saber de onde vem o conselho ou a informação: se está na internet, é confiável.
Pior ainda: a pesquisa revela que jovens que se sentem confusos e enfrentam um período difícil, confuso e estressante tendem a procurar confidentes e conselhos na internet. É aí que mora o perigo. Face às sandices que circulam na rede, a atitude inteligente seria a posta: desconfiança crítica, até se ter a certeza de que a fonte é segura, respeitável e merece atenção.
É tolice pensar que todo jovem é crédulo e embarcará na onda de um psicopata. Afinal, os jovens são nativos digitais, filhos diletos da net. Eles conhecem esse mundo. Mas ainda assim podem ceder ao impulso de confiar em estranhos, se o cara for habilidoso e envolvente. Até adulto desconfiado cai nessas armadilhas.
A família não precisa perder o sono, mas também não deve perder de vista o que se passa no quarto ao lado.
Afinal, os filhos da internet são também os seus filhos. Se for preciso escolher (e não é), melhor ser chamado de retrógrado do que ver sua filhinha nas garras de um maluco.

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